domingo, 29 de março de 2009

Subjetividade Perdida

Eu estava refletindo sobre a situação da subjetividade e dos direitos humanos, em um texto de Peter Pál Pelbart, denominado inclusive Subjetividade e Direitos Humanos IV, publicado pela Casa do Psicólogo no livro Conselho Federal de Psicologia: Psicologia, Direitos Humanos e Sofrimento Mental, e pensando como nós somos reféns dessa sociedade capitalista, na qual a nossa subjetividade é quase esquecida para dar lugar a lógica da produção, onde as pessoas só tem valor pelo que produzem e onde somos desapossados da nossa própria vida. E achei algumas partes muito interessantes desse texto que gostaria de compartilhar aqui no blog. Finalizo essa primeira postagem com alguns trechos do texto de Pelbart, modificado por mim, mas sem fugir do contexto original e da ideia a ser passada pelo autor.

"O ser humano precisa não estar sempre no cotidiano, precisa sair do cotidiano e entrar noutros niveis, noutras sensações do mundo, nas quais a existência seja possivel e interessante para o espírito. Precisamos, também, fazer coisas não produtivas, sair da lógica da produção, ter objetivos diferentes desses, não há apenas um caminho, a vida é mais rica de redes e nós de sentidos e sensações. Temos que sair de dentro do porta moedas e entrarmos no êxtase, na contemplação, na calma, nos sentidos do corpo, no corpo, na poesia, em visões, no espanto, no assombro, no gozo, no inconsciente, na perda, no esvaziamento, no despreendimento, na queda, precisamos tirar os sapatos, deitarmo-nos no chão, entrarmos na imaginação, nas histórias, no pensamento, nas palavras, no humor, na relação com os outros. Nós precisamos muito disso e estamos a ter muito pouco, o espírito esta em erosão, a cultura esta em erosão, e por isso, às vezes, estamos muito tristes ou temos a sensação de que a vida desapareceu de cá de dentro."

(Referenciado à Vera Mantero, publicado na revista A vida pobre)

"Existe um fosso à nossa volta, é invisível, mas faz-se sentir mesmo no meio do concerto mais empolgante. O que ouvimos, toca-nos, mas é como se não nos tocasse, se olharmos bem; o que lemos fica apenas em cada um, não vai além de nós e acaba por amarelecer, sem eco; o que vemos nas galerias de arte e o que lá se diz é como se não tivessem a ver com nossas vidas. Há um grande buraco no meio das pessoas, que lhes abafa a fala e absorve as vozes que vem dos outros. Já não precisamos nos exprimir, tudo nos exprime, e muito melhor do que poderiamos fazê-lo, e quem somos nós para pretender assim exprimir emoções tão fortes, mais fortes do que todas aquelas de que somos capazes? Por isso nos calamos. A contemporaneidade perfeita e esvaziada teria-nos despossuído do poder de gaguejar, de chorar ou até mesmo de sentir."

(Referenciado à José Gil, filósofo e comentador de Fernando Pessoa)